Na realidade, a sexualidade “nasce” com o bebé e vai evoluindo na sua forma e expressão ao longo de toda a vida. Isto é, o desenvolvimento psicossexual é um processo complexo e subtil, sujeito a diversos acasos à medida que o ser humano passa pela infância, adolescência, idade adulta e velhice (Félix, 1995).
Embora o ser humano seja um ser sexuado, a sexualidade é diferente consoante a idade. As crianças, os adolescentes, os adultos e as pessoas idosas têm interesses sexuais, manifestando a sua sexualidade através de determinados comportamentos. Contudo, a sexualidade muda com a idade, verificando-se características próprias que estão associadas a cada fase da vida.
Também em cada etapa da vida, as pessoas vivem a sua sexualidade de formas diferentes, estando esta sujeita à influência de diversos fatores socioculturais e às particularidades individuais do desenvolvimento biofisiológico e psicoafetivo de cada pessoa.
Ao longo do ciclo da vida, do ponto de vista biofisiológico existem três períodos importantes: o período pré-natal, a puberdade e o climatério.
Do ponto de vista psicossocial distinguem-se claramente: o período pré-pubertário, a adolescência, a vida adulta e a velhice.
Neste contexto, é difícil definir a sexualidade de uma forma sintética, pois cada período tem as suas especificidades. Apesar disso, as maiores diferenças no desenvolvimento verificam-se entre a fase da pré-puberdade e a fase da pós-puberdade. Nesta seção, pode encontrar informação sobre as principais características que definem cada período da nossa evolução.
.A sexualidade pré-pubertária (entre os 0 e os 10-12 anos)
Na infância, a sexualidade é encarada como uma descoberta, nomeadamente do próprio corpo, considerando-se como o primeiro ato sexual da criança mamar no peito da mãe. Nesta fase, a sexualidade é vivida e desenvolve-se nas relações com as sensações corporais e em interação com as figuras de apego.
As principais características da sexualidade nas crianças são:
• Os órgãos genitais estão pouco desenvolvidos.
• Os caracteres sexuais apenas iniciam o seu desenvolvimento.
• A quantidade de hormonas sexuais na circulação sanguínea é também muito pequena.
• As sensações de prazer não adquiriram ainda um significado específico, devido a fatores hormonais e sociais.
• Os estímulos táteis sobre o próprio corpo são os que têm maior poder propiciador de respostas fisiológicas sexuais.
• A sexualidade está mediatizada pelos afetos.
• Interiorização da moral sexual.
Até aos dois/três anos, as crianças adquirem consciência da sua identidade sexual, ou seja, reconhecem-se e identificam-se como rapaz ou rapariga. Simultaneamente, iniciam um processo de aprendizagem e interiorização das funções que a sociedade considera próprias do rapaz ou da rapariga, e que estão associadas ao papel de género.
Também se verifica o controlo dos esfíncteres e a criança começa a questionar-se sobre a origem dos bebés. Os modelos de identificação ou imitação também surgem nesta fase, assim como os problemas relativos ao ciúme (em que a criança não compreende nem aceita uma possível partilha das figuras de apego – aparecimento do Complexo de Caim e Complexo de Édipo).
.A sexualidade na adolescência
A puberdade é uma época de transição entre a infância e a idade adulta, um período marcado por profundas alterações biológicas, fisiológicas e psicológicas, durante o qual o corpo adquire os caracteres sexuais (masculinos e femininos) associados ao sexo biológico, dando-se igualmente a maturação do aparelho reprodutor e a aquisição da capacidade reprodutiva.
A descoberta da sexualidade atinge o seu auge. O desejo sexual torna-se algo mais específico e vários estímulos adquirem valor sexual. Com uma maior atividade hormonal, os jovens passam por várias alterações ao nível do corpo, designadamente aumento dos órgãos sexuais, ejaculação noturna no caso dos rapazes e a primeira menstruação no caso das raparigas. Habitualmente é neste período que ocorrem os primeiros contatos sexuais e as primeiras experiências.
Vejamos de forma breve quais as mudanças que se produzem e que definem a adolescência (López e Fuertes, 1999):
• Mudanças biofisiológicas
Com a chegada da puberdade, produz-se um conjunto de mudanças fisiológicas (ex: estatura, peso) e também uma sequência de mudanças especificamente sexuais que culminarão na maturação dos órgãos sexuais, assim como na capacidade de resposta à estimulação sexual.
• Mudanças psicológicas
O adolescente adquire uma nova forma de pensamento que lhe permite formular hipóteses, raciocinar sobre elas e extrair as suas próprias conclusões. Estas novas possibilidades intelectuais também lhe permitem refletir sobre os seus próprios pensamentos, bem como orientar o seu afeto para determinadas ideias e valores.
O processo de formação da identidade pessoal e sexual é a tarefa mais importante do adolescente no que se refere à sua personalidade.
• Mudanças na capacidade de integração social
Nesta fase, os jovens desenvolvem a capacidade de integração com o grupo de iguais e a capacidade de integração no mundo dos adultos. Surgem também novas necessidades afetivas e sexuais que podem conduzir à dissolução do grupo, em favor da formação de casais.
Nesta fase, vai também surgir outra alteração importante: a especificação da orientação sexual.
• Manifestações anatómicas e fisiológicas
Nos rapazes:
Nos rapazes, as transformações começam por volta dos 9 aos 14 anos e são muito mais demoradas do que nas raparigas.
As principais características das mudanças são:
• Surgimento de pêlos nos púbis, nas axilas e no peito;
• Aumento dos testículos e do pénis;
• Crescimento da barba;
• Voz grossa;
• Ombros mais largos;
• Aumento da massa muscular;
• Início da produção de espermatozoides;
• Aumento do peso e da estatura
Nesta fase os rapazes têm as primeiras ejaculações, que geralmente ocorrem durante o sono (os chamados “sonhos molhados”).
Nas raparigas:
Nas raparigas inicia-se, em geral, entre os 8 e os 13 anos, variando este período de pessoa para pessoa. Em geral, a puberdade tem início com a primeira menstruação (menarca), que coincide com o surgimento de uma série de transformações do corpo, que já se vinham manifestando na fase conhecida como pré-puberdade.
As principais características são:
• Alargamento dos ossos da bacia (ancas);
• Início do ciclo menstrual (menarca);
• Surgimento de pêlos no púbis e nas axilas;
• Depósito de gordura nas nádegas, nos quadris e nas coxas;
• Desenvolvimento das mamas.
Surge a primeira menstruação (menarca), que pode aparecer inesperadamente ou chegar precedida de vários dias de dores abdominais e de cabeça.
.A sexualidade na vida adulta
Em comparação com a adolescência, na idade adulta a sexualidade é vivida mais tranquilamente. Porém, a sexualidade continua a ser é muito distinta de pessoa para pessoa, como consequência do grau de diversidade que implicam as suas formas de vida.
Na idade adulta, a maioria das pessoas encaram a sexualidade com normalidade. Isto advém de uma maior maturidade resultante de uma vida familiar tendencialmente mais estável ou por possuírem um/a companheiro/a fixo/a.
Levinson (1977, citado por López e Fuertes, 1999) refere que durante a primeira etapa da vida adulta dão-se mudanças significativas que correspondem a um período definido:
• Fim do período de crescimento fisiológico, alcançando uma certa estabilidade na figura corporal;
• Aquisição da maioridade legal;
• Fim do período de escolarização obrigatória;
• Entrada no mercado de trabalho com remuneração;
• Formação de pares sexuais ou acesso ao casamento;
• Nascimento de filhos.
.A sexualidade no envelhecimento
Ao contrário do que a maioria das pessoas pensa, a entrada numa idade adulta mais avançada não significa colocar a vida sexual de parte.
O envelhecimento é um processo indutivo de várias mudanças no indivíduo, nomeadamente ao nível físico, mental e social. Estas mudanças tendem a afetar a expressão da sexualidade, na medida em que se torna necessário para a pessoa “idosa” redefinir objetivos, isto é, reconhecer que está numa nova fase do ciclo vital e que, tal como as anteriores, está associada a determinados “acontecimentos padrão”, assim como de crises de desenvolvimento próprias da fase em questão.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) adotou o critério do intervalo de idades entre os 60 e os 65 anos para definir as pessoas idosas, o que, na maioria dos países desenvolvidos, corresponde ao início da idade da reforma, sendo que o fator cronológico assume aqui uma importância significativa. De facto, a componente biológica é fundamental no processo de envelhecimento, e tem uma dinâmica própria, sobre a qual o ser humano não tem qualquer influência ou poder de decisão.
Parece ser consensual e lógico que o sexo e a sexualidade fazem parte da vida da pessoa idosa, mesmo que haja uma redução da frequência e da intensidade. Se por um lado há diminuição de energia, força e vitalidade, por outro há tendencialmente um aumento do tempo disponível e diminuição de preocupações profissionais.
A sexualidade das pessoas idosas continua a ser um tema que dá origem a diversos mitos, que dominam as crenças da atualidade, pautadas pela ideia de que o homem e a mulher mais velhos são sexualmente pouco atraentes, e incapazes de se interessarem por sexo (Murphree e Neighbors, 2009).
Na obra Sexuality, Sexual Health and Ageing, Merryn Gott (2005) faz referência a um mito designado “the asexual old age”, que corresponde a um estereótipo caracterizado por uma incompatibilidade entre Sexualidade e Envelhecimento, e segundo o qual as pessoas idosas não praticam sexo.
Além deste, é ainda possível fazer referência a outros mitos (Correia, 2003):
• O coito e a emissão de sémen são debilitantes e provocam o envelhecimento e a morte.
• A vida pode ser prolongada pela abstinência na juventude e pela inatividade mais tarde.
• A masturbação é uma atividade infantil que deve ser posta de parte quando se atinge a idade adulta. Só é praticada por pessoas idosas se estas estiverem seriamente perturbadas.
• A satisfação na relação sexual diminui consideravelmente depois da menopausa.
• Os homens idosos são particularmente vulneráveis a desvios sexuais, tais como o exibicionismo e as parafilias.
• As mulheres idosas que continuam a apreciar o sexo foram provavelmente ninfomaníacas quando jovens.
• A maioria dos homens idosos perde o desejo e a capacidade para ter relações sexuais.
• As pessoas idosas com doenças crónicas ou deficiências físicas devem cessar completamente a sua atividade sexual.
• A capacidade de execução sexual mantém-se sempre igual ao longo da vida.
• As pessoas idosas que estão vários anos sem ter relações sexuais não mais poderão vir a tê-las no futuro.
O processo de envelhecimento implica várias alterações ao nível dos determinantes biológicos, que englobam os fatores genéticos, neurológicos, hormonais, anatómicos e fisiológicos, que poderão exercer alguma influência na vivência do amor e da sexualidade. Tal não significa que determinam a sua cessação, podendo antes exigir alguma adaptação.
No caso dos homens, os autores (López e Fuertes, 1999) fazem referência às seguintes alterações biofisiológicas:
• Diminuição da produção de esperma, que se inicia por volta dos 40 anos, mas sem total desaparecimento;
• A ereção é mais lenta e necessita de uma maior estimulação, sendo também menos firme;
• Menor quantidade de sémen emitido, havendo uma menor necessidade de ejacular e sensações orgásticas menos intensas;
• Os testículos elevam-se menos e mais lentamente;
• Reduz-se a tensão muscular durante a relação e aparece um outro conjunto de alterações fisiológicas que acompanham a resposta sexual;
• O período refratário alarga-se, ou seja, o tempo entre uma ejaculação e a seguinte prolonga-se.
Em suma, verifica-se uma perda nítida de vigor fisiológico nos comportamentos sexuais coitais.
Relativamente às mulheres, surgem as seguintes alterações biofisiológicas: (López e Fuertes, 1999)
• Diminui o tamanho da vagina, que também se torna mais estreita e perde elasticidade (estas alterações na vagina podem tornar o coito doloroso se não se aplicam cremes adequados); porém, a resposta clitoridiana não sofre alterações importantes;
• Os seios diminuem de tamanho e perdem firmeza;
• A lubrificação vaginal diminui em quantidade e é mais lenta;
• A distribuição de gordura deixa de ser “tipicamente feminina” e dão-se alterações importantes na figura corporal;
• As alterações fisiológicas que acompanham a resposta sexual diminuem significativamente: os seios quase não aumentam de tamanho; produz-se uma menor vasocongestão dos órgãos genitais, embora continuem a ser uma zona erógena privilegiada; diminui a intensidade e a frequência das contrações;
No caso das mulheres, as alterações referidas estão associadas a uma diminuição da produção de estrogéneo após a menopausa (Amaro, 2006).
É possível ainda referir outros fatores psicossociais que condicionam a atividade sexual das pessoas idosas (Lópes e Fuertes, 1999):
• Normalmente as relações rotineiras, insatisfatórias ou conflituosas diminuem o desejo sexual, o grau de excitação e, progressivamente, as próprias capacidades sexuais;
• As dificuldades económicas ou sociais levam à diminuição do interesse e das capacidades sexuais, nomeadamente pela situação de tensão e sensação de marginalização que provocam;
• Condições físicas inadequadas, como sejam obesidade, falta de higiene, fadiga física ou mental, diminuem o desejo, as próprias capacidades e as possibilidades de se tornarem atrativos para os outros;
• O medo de não ser capaz de ter relações sexuais coitais ou de proporcionar prazer ao parceiro limita a capacidade sexual, devido à ansiedade e insegurança que provoca;
• A atitude dos filhos e da sociedade em geral, habitualmente muito crítica face à ideia de que os seus pais possam interessar-se por sexo, leva a que muitas pessoas idosas se culpabilizem e fiquem assim limitadas na sua atividade sexual.
Não obstante estes fatores, López e Fuertes (1999) consideram que existem outros fatores que podem contribuir de forma positiva, permitindo às pessoas mais velhas desfrutar de experiências gratificantes do ponto de vista das relações sexuais, e também do ponto de vista dos afetos.
É importante voltar a salientar que estas alterações não ocorrem nem na mesma altura nem da mesma forma em todas as pessoas. Cada indivíduo tem o seu próprio ritmo e, para alguns, estas mudanças não chegam a ser muito pronunciadas.
Também o modo como cada pessoa vive estas alterações é diferente. Algumas encaram-nas como naturais, enquanto outras ficam alarmadas e preocupadas, pensando que vão deixar de poder ter relações sexuais.
Para melhor lidar com o impacto destas alterações, a pessoa em questão pode falar com um/a técnico/a de saúde (médico/a de família, por exemplo; ou ginecologista, para as mulheres; ou urologista, para os homens) ou sexólogo/a, a fim de obter ajuda para ultrapassar eventuais dificuldades sexuais que possam surgir nesta fase.